COMO ESCREVER RESULTADOS E DISCUSSÕES: 5 REGRAS FUNDAMENTAIS

       

     Fonte: Freepik (2025).

    Para muitos pesquisadores, o momento da verdade não chega no laboratório ou em campo, mas diante de uma tela em branco. Após meses ou anos de meticulosa coleta de dados, a tarefa de escrever as seções "Resultados" e "Discussão" pode parecer um obstáculo final avassalador. Surge uma ansiedade comum: como transformar dados brutos em uma narrativa convincente? Como argumentar em favor de suas descobertas sem exagerar?

É tentador encarar esta etapa como uma mera tarefa, a etapa administrativa final antes da publicação. Mas essa perspectiva erra completamente o alvo. As seções de Resultados e Discussão são o cerne do seu artigo. É aqui que você vai além de simplesmente relatar o que fez e começa a explicar o que tudo isso significa. É aqui que a verdadeira história da sua pesquisa é contada, onde os dados se transformam em conhecimento e onde sua contribuição para a sua área é consolidada.

1 A REGRA DE OURO: OS RESULTADOS DIZEM O QUÊ , A DISCUSSÃO DIZ O PORQUÊ

O princípio mais fundamental e inegociável é a separação estrita entre as seções de Resultados e Discussão. A seção de Resultados deve apresentar apenas os fatos e dados de forma objetiva. Seu objetivo é relatar o que você encontrou, usando texto, tabelas e figuras, sem adicionar nenhuma camada de análise ou interpretação. É um espaço para relatos puros e sem adornos.

Em contraste, a seção Discussão é onde você interpreta esses resultados. Sua função principal é explicar a importância das suas descobertas, analisar o que elas significam em um contexto mais amplo e construir um argumento com base nas evidências que você acabou de apresentar. Ela responde à pergunta  importante "E daí?" que seus resultados invariavelmente levantam.

A seção de resultados de um artigo de pesquisa informa ao leitor o que você descobriu, enquanto a seção de discussão informa ao leitor o que suas descobertas significam.

Essa separação é  importante porque reflete o próprio método científico: primeiro a observação, depois a interpretação. Ela mantém a objetividade científica, permitindo que os leitores examinem as evidências por si próprios antes de se guiarem pela sua análise. Isso gera imensa credibilidade e cria uma base clara e lógica para os argumentos que você apresentará na discussão, garantindo que seu artigo seja rigoroso e persuasivo. 

2 A ESTRUTURA OCULTA: SEU ARTIGO DEVE TER O FORMATO DE UMA AMPULHETA

Um ótimo artigo científico tem um formato narrativo natural: a ampulheta. Essa estrutura guia o leitor em uma jornada intelectual lógica e satisfatória. O artigo começa de forma ampla, aprofunda-se em um foco específico e, em seguida, expande-se para implicações mais amplas.

A introdução segue a famosa estrutura de "pirâmide invertida". Você começa com a área geral de pesquisa, revisa a literatura existente e, progressivamente, estreita seu foco até chegar à questão de pesquisa e à hipótese específicas do seu estudo. As seções de Métodos e Resultados permanecem estritamente focadas neste trabalho específico.

A seção Discussão, então, inverte esse processo. Este é o momento em que o autor "dá alguns passos para trás para ter uma visão geral dos dados". Você começa com suas descobertas específicas e gradualmente expande seu foco para fora. Você conecta seus resultados ao campo mais amplo do conhecimento, discute suas implicações mais amplas e situa sua contribuição específica dentro da discussão acadêmica mais ampla.

Essa forma de ampulheta cumpre um contrato intelectual com o leitor; cria uma sensação de completude ao devolvê-lo ao contexto mais amplo, mas agora munido do novo conhecimento adquirido com seu estudo.

3 A RECEITA SECRETA: UMA ÓTIMA DISCUSSÃO SEGUE UMA ESTRUTURA FLEXÍVEL

Uma discussão eficaz não é um monólogo desestruturado, mas sim um exame rigoroso e metódico das suas descobertas. Em vez de uma redação intimidadora e livre, uma discussão sólida é construída a partir de uma série de "movimentos" retóricos. Embora a estrutura exata seja flexível, uma discussão eficaz normalmente inclui um conjunto básico de componentes que garantem a cobertura de todas as bases intelectuais cruciais.

Pense nelas não como uma fórmula rígida, mas como uma estrutura de movimentos essenciais e comuns. Alguns, como declarar seus resultados e colocá-los em diálogo com a literatura existente, são essenciais. Outros são usados com frequência variável, dependendo das necessidades do seu estudo.

1. Resuma e vincule: Comece resumindo suas descobertas mais importantes e vinculando-as explicitamente à questão de pesquisa original que você propôs na introdução. Isso lembra imediatamente o leitor do propósito do estudo e de como você o abordou;

2. Forneça contexto: insira suas descobertas na conversa existente. Retorne à sua revisão bibliográfica e compare seus resultados com pesquisas anteriores. Eles corroboram, contradizem ou ampliam o conhecimento existente?

3. Explique o inesperado: Aborde diretamente quaisquer resultados surpreendentes, negativos ou contraditórios. Não os ignore. Ofereça uma interpretação razoável para o motivo pelo qual essas descobertas inesperadas podem ter ocorrido;

4. Reconheça as limitações: discuta abertamente as fraquezas ou limitações do seu estudo. Quais são os limites da sua pesquisa? Quais fatores podem ter influenciado os resultados?

5. Aponte o caminho a seguir: Com base nas suas descobertas e nas limitações delas, recomende áreas específicas para possíveis pesquisas complementares. Mostre aos leitores como seu trabalho abre novas questões.

6. Declare a importância: Conclua reafirmando sua descoberta mais importante e explicando suas implicações mais amplas. Por que esta pesquisa é importante? Qual é a principal mensagem?

Encarar a discussão como um processo estruturado é revolucionário. Transforma uma tarefa complexa em um conjunto claro de etapas, garantindo que sua análise seja completa, lógica e convincente.

4. O PARADOXO DA CREDIBILIDADE: DESTACAR SUAS FALHAS O TORNA MAIS FORTE

Pode parecer contraintuitivo, mas uma das maneiras mais poderosas de fortalecer seu artigo é admitir abertamente suas falhas. Reconhecer as limitações da sua pesquisa não é sinal de fraqueza; é uma demonstração de honestidade intelectual e autoconsciência crítica.

Esta etapa de autocrítica é essencial para construir confiança. Nenhum estudo é perfeito, e pesquisadores experientes sabem disso. Essa prática está alinhada ao ethos científico fundamental de falseabilidade e humildade intelectual. Ao demonstrar que você entende onde seu argumento pode ser questionado, você demonstra domínio sobre o assunto e reforça suas afirmações.

Abordar as limitações ajuda a construir sua credibilidade como escritor, porque o leitor vê que você pensou criticamente sobre o que seu estudo aborda e não aborda.

Ao definir claramente os limites do que seu estudo pode ou não alegar, você faz com que suas descobertas reais pareçam mais robustas e confiáveis naquele contexto específico. Você não está tentando provar uma verdade universal, mas sim elaborando cuidadosamente uma contribuição específica e defensável para o conhecimento. 

5 A VOZ DO ESCRITOR: ARGUMENTE COM PRECISÃO, NÃO COM ABSOLUTOS

A linguagem da escrita acadêmica, especialmente na seção Discussão, é deliberadamente matizada. Seu objetivo não é declarar uma verdade absoluta e final, mas contribuir com uma interpretação bem fundamentada para um diálogo acadêmico contínuo. Isso é mais do que uma escolha estilística; é uma necessidade epistemológica. Reflete uma profunda compreensão de que o conhecimento é provisório e que seu trabalho é apenas um passo em uma longa e contínua conversa, não a palavra final. Escritores sofisticados usam a linguagem para "sinalizar incerteza, possibilidade ou probabilidade, em vez de certeza".

Essa precisão é mais evidente na escolha dos verbos. A seção Resultados apresenta fatos, enquanto a seção Discussão constrói um argumento interpretativo.

PARA RELATÓRIOS OBJETIVOS (RESULTADOS)

PARA ARGUMENTO INTERPRETATIVO (DISCUSSÃO)

encontrar

sugerir

descobrir

indicar

observar

revelar

identificar

mostrar

observação

ilustrar

obter

apontar para

demonstrar

Essa precisão linguística é uma marca registrada da escrita acadêmica sofisticada. Ela demonstra respeito pela complexidade do seu tema e reconhece que o conhecimento é construído de forma incremental por meio de uma comunidade de pesquisadores. Demonstra que você entende o seu papel: não como alguém que tem a palavra final, mas como alguém que está avançando na conversa.

CONCLUSÃO: DE REPÓRTER A INTÉRPRETE

Escrever um artigo de pesquisa impactante exige uma mudança  importante de mentalidade. Na seção Resultados, você é um repórter meticuloso, apresentando os fatos de forma clara e objetiva. Já na seção Discussão, você deve se tornar um intérprete cuidadoso, entrelaçando esses fatos em uma narrativa significativa que explique sua importância.

Ao assumir esse duplo papel e aplicar esses cinco princípios, você pode transformar sua escrita de um simples resumo de dados em um artigo acadêmico convincente e influente.

REFERÊNCIAS

CICERO, C. Q. Artigo acadêmico: análise e discussão dos resultados. WordPress, 2018. Disponível em: https://cicerocq.wordpress.com/wp-content/uploads/2018/12/Artigo-academico-_-analise-e-discussao-dos-resultados-1.pdf. Acesso em: 22 out. 2025.

PUC GOIÁS. Relatando os resultados de sua pesquisa. Goiânia: Pontifícia Universidade Católica de Goiás, 2003. Disponível em: https://professor.pucgoias.edu.br/SiteDocente/admin/arquivosUpload/7820/material/RELATANDO%20OS%20RESULTADOS%20DE%20SUA%20PESQUISA.pdf. Acesso em: 22 out. 2025.

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